de sofrer e amar, a gente não se desfaz.

1.11.15

de filhos e poetas.

portugal é o país dos poetas mesmo.

eu já não vejo tevê e nem consigo entender completamente o sistema político daqui. mas ligo-a mesmo assim e vejo um sósia de um poeta famoso de quem não sou nada íntima. é o filho do famoso, sendo que o famoso nunca apareceu na televisão e existem uma ou duas fotografias dele, só. o poeta famoso foi famoso por não dar entrevistas. enfim.

já o filho do poeta famoso aparece na televisão, é jornalista, faz comentários políticos e ainda diz a expressão brasileira "ajoelhou, tem que rezar" (será essa uma expressão que reflete a cultura do estupro?).

o filho do poeta famoso, como também o filho da poeta famosa, aparece na tv a dizer coisas. mas as posições daquele filho são mais progressistas do que as deste filho.

“Versos e filhos como os dás ao mundo?”
jorge de sena 

23.10.15

não ouso repetir o que pedi

parada na escada digo, baixo, amor, espero por um beijo que acaba não vindo. me resigno, já vi tudo mudar: eu passar a não dormir, você passar de enérgica a esvaziada, a gente arranjar móveis novos, cantos onde passamos sozinhas a solidão do nosso encontro perpétuo;

digo que o beijo que esperava não vem mesmo, mas não ouso repetir o que pedi.

estar em lisboa mas nunca ver ou voar em lisboa. numa calçada da mouraria - onde estive com ela com certeza - vi um passarinho enjaulado e dois balões de fala:
"OLÁ"
"LISBOA"
Perdi os nossos desejos,
confessionei, embora
talvez pense que só me
faltam as mãos com que recuperá-los.

O século é de mãos, mas
se reduz mais aos dedos
e esses multiplicam.

Será um dia a vez
das unhas, a vez do ócio, a vez
das linhas contidas em cada almofada
atrás das unhas.

Ok, Matilde, você venceu,
não sei com que qualificações
posso continuar carreiras
nas canaletas de um sucesso prévio.

Pra onde eu quero ir
não tem molde e eu
não disponho das ferramentas.

Vida árida de lata e polipropileno.
Bem diferente do pó de terra
em que o século XX achava
que desfazia o mundo.
não sei quando primeiro me ocorreu que roma podia ser um bairro. era o começo de 2011, a década e o amor ainda estavam no início. por causa de uma greve de metro tive de ir por cima da superfície. e aí achei: avenidas com nome de países, países que se tornavam cidades, não sei quando me dei conta de que podia transplantar praqui todos os meus sonhos e arrastar você pra eles comigo e te obrigar a viver numa terra alheia.

20.10.15

releituras



que fiona apple cantasse isso. mas acho que ela é tão traumatizada com relacionamentos que nunca vai pedir alguém pra tar do lado dela antes do morrer.

19.10.15

até abrir o caderno já não sabia mais. estou com uma vontade louca de fazer xixi (como decidir se isso interessa? - já sei: não, it doesn't)

cidade de óbidos - é quase
(vila)
ódios,
adiós
o que faço?
na verdade vim
praqui e não sei
ainda o que estou
fazendo, mas se calhar escrevo um livro chamado muralha -
porque já morei (demorei) colada ao muro do castelo de São Jorge, pela totalidade (eternidade) de dois anos. e sabia que não seriam eternos. e pra além disso sabia que o castelo não é mais uma morada, como foi de reis e rainhas, com trono e coroas e um armário (para armas) em que cetros e pedraria estão expostos, mas o castelo é já uma ruína, e pertence a um Santo, que já não esconde a presença do mais preto, aqueles chamados de mouros e que ocuparam à sua moda aquela localidade chamada mouraria (que é onde morei-demorei).

 
 
 

1.7.15

autobiografia sem fatos

Seria muito mais fácil se eu só encontrasse um café onde pudesse me sentar e ler pelo valor de 01 tarde. Consegui me maravilhar com tortas, quando o que queria era o que tinha andado à procura nas noites anteriores: um bolo de morango e chantily. Mas o que tinham na vitine não era bem o que estava à venda, ou seja - por uma fatia eu precisava comprar o bolo todo. Não estava me sentindo tão empresária, então não fiz. Era preciso que eu conseguisse me sentar e ler o final de um livro de poesia até me arderem os olhos: era daqueles poetas herméticos. Mas vi a funcionária do café sendo maltratada pela dona do café e tudo isso me desanimou. Poesia uma hora dessas? Não importa se a duas portas daqui tinha sido o escritório do Fernando Pessoa, onde ele escreveu páginas do livro do desassossego, criando um guardador de livros que talvez desempoeirasse um volume de mensagem duas quadras daqui. Era indiferente se a duas quadras seria a rua dos douradores, se aqui se vendiam bolos dourados e não os que procurava. Aqui agiam com um bom humor a disfarçar um destrato pleno. O próprio jeito de decorar o café era a síntese da mímesis: as cores eram disfarçadamente antigas e desbotadas, mas o cartaz era de plástico. Tudo parecia desonesto e fingidor.

6.6.15

rascunho III, nunca terminado

e eu que reclamava tanto, que estava tão infeliz por não estar onde era suposto que eu estivesse (que que lugar era esse?), acabo vendo que afinal estou feliz. mais feliz do que nunca? não vamos exagerar. talvez fosse preciso deambular sozinha pela cidade, o que me faltava: retomá-la. sempre me senti dona de lisboa, mas a falta de dinheiro fez com que ela me engolisse, me marcasse com ferrete como estrangeira. porque não trabalho fora, nunca quis realmente que isso mudasse, então estou presa no entre turista e imigrante, uma moradora sempre temporária que não consegue licença que a cidade me aceite.

agora já tá calor, há um pouco de cheiro de praia, porque insistem em lavar a jato bancos de pedra - com toda essa seca pelo mundo. quem nasceu navegador nunca acha que a água há de faltar.


rascunho II

sempre que a lua está na casa 12
dá ziquizira no estômago, eu não digiro.

18.5.15

rascunho

meus amigos não se casam. só os primos. meus amigos apenas vão a casamentos e postam as fotos dos amigos deles no facebook. meus amigos não são a preta gil, mas eu seria amiga dela, com gosto.