eu juro que, andando na rua, às vezes, não por causa do título da minha dissertação, fico pensando no poema da sophia, que inaugura o primeiro livro que ela publicou, em 1944, com exatamente a minha idade.
Apesar das ruínas e da morte,
Onde sempre acabou cada ilusão,
A força dos meus sonhos é tão forte,
Que de tudo renasce a exaltação
E nunca as minhas mãos ficam vazias.
e a vida tem sido de uma resignação que me propele pra frente sempre apesar de. talvez por isso eu tenha me lembrado de um trecho da clarice:
“Uma das coisas que aprendi é
que se deve viver apesar de. Apesar de, se deve comer. Apesar de, se
deve amar. Apesar de, se deve morrer. Inclusive muitas vezes é o próprio
apesar de que nos empurra para a frente.
Foi o apesar de que me deu uma angústia que insatisfeita fui a criadora de minha própria vida. Foi apesar de que parei na rua e fiquei olhando para você enquanto você esperava um táxi. E desde logo desejando você, esse teu corpo que nem sequer é bonito, mas é o corpo que eu quero. Mas quero inteira, com a alma também. Por isso, não faz mal que você não venha, esperarei quanto tempo for preciso.”
Foi o apesar de que me deu uma angústia que insatisfeita fui a criadora de minha própria vida. Foi apesar de que parei na rua e fiquei olhando para você enquanto você esperava um táxi. E desde logo desejando você, esse teu corpo que nem sequer é bonito, mas é o corpo que eu quero. Mas quero inteira, com a alma também. Por isso, não faz mal que você não venha, esperarei quanto tempo for preciso.”
(uma aprendizagem ou o livro dos prazeres)
deixei de escrever durante umas três semanas, durante as quais tenho me corroído - às vezes mais, às vezes menos - com algumas imagens com que a memória nos tortura. a memória sempre nos faz voltar, e dói tanto, quando o presente é terrivelmente insuficiente. "apesar de", assombra-me uma cena: perto da última vez em que te vi, entrei num táxi, com a clara noção de que não era nada a última vez, apesar de meu corpo com maldade ainda desejar "o seu corpo que não é nem bonito, mas é o que quero". está vendo? por isso não devia escrever nada. tem muito o que dizer, mas me confesso demais. te dou muita certeza de que te esperarei para sempre (till i find somebody new), "apesar das ruínas e da morte". e quando a certeza é a ressurreição de uma ilusão cega? qual é a correspondência entre o sonho e a ilusão? para o calderón de la barca a vida é sonho, que vivemos e sonhamos, a um tempo, acordados. de olhos abertos me lembro de tantos momentos, de tantas vidas que incluem a vida que nunca chegaremos a ter, precisamente pelo fato de você não tê-la querido - muito por medo, e a outra parte por incapacidade de ser feliz e de saber viver contra o chronos, cujo sentido é oposto ao sentido que damos ao nosso destino.
apesar do tempo que a tudo arruína, apesar da destruição patente nos escombros, ainda espero, porque é o que me resta.
Um comentário:
isso é tão dolorosamente familiar pra mim.
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